terça-feira, 22 de julho de 2025

COP 30 Brasil/Belém chegando sem debate nos cursos de jornalismo e na imprensa catarinense

 

Míriam Santini de Abreu, jornalista

A poucos meses da COP 30 Brasil/Belém, há algum curso de jornalismo em Santa Catarina discutindo a relação entre sociedade e natureza nas coberturas jornalísticas? Desconheço. 

O estado volta e meia experimenta eventos climáticos extremos, mas até agora também não vi um bom conjunto de reportagens sobre a inserção de Santa Catarina na COP 30 Brasil/Belém. 

Foi criada uma “Frente Parlamentar para o Fortalecimento da COP-30”, mas as poucas notícias sobre a atuação dos 14 deputados envolvidos reproduzem declarações elogiosas ao “modelo sustentável de produção” do estado e à perspectiva de abertura de negócios do “mercado de carbono”, como esta, no NSC Total: https://www.nsctotal.com.br/noticias/sc-quer-buscar-solucao-para-velho-problema-em-evento-mundial

Enquanto isso, na UFRGS está em plena produção de conhecimento o Laboratório de Comunicação Climática (@comclima.ufrgs) e, de 24 a 26 de setembro, será realizado o VI Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo Ambiental, que terá como tema “A prevenção na pesquisa em Jornalismo Ambiental diante dos desastres”. O evento é uma realização do Grupo de Pesquisa em Jornalismo Ambiental CNPq/UFRGS, com o apoio do PPGCOM/UFRGS e POSCOM/UFSM.

Nesta terça-feira (22), abro o site do Sul 21, do Brasil de Fato RS e do Matinal, exemplos de jornalismo independente do Rio Grande do Sul. Nos três, notícias ou reportagens na capa sobre temas ligados a conflitos urbanos e climáticos. A pauta era frequente nos veículos do estado vizinho mesmo antes do desastre climático que devastou o RS em 2024.

Ao contrário, na terra onde, em março de 2004, passou o Furacão Catarina, lamentavelmente falta apetite para a temática. Falta jornalismo. E ninguém parece se importar. 

terça-feira, 1 de julho de 2025

Florianópolis e “crescimento sustentável”, “exclusão social”, “qualidade de vida”: jornalismo e o esgoto da ideologia



Míriam Santini de Abreu, jornalista

O desafio de revirar a linguagem é urgente no jornalismo ambiental. Conceitos e discursos nascidos nos documentos dos anos 1970 para cá estão todos apodrecidos. Não podem ser usados! A saída: mergulhar no cotidiano, no vivido, para de lá trazer a palavra fresca, grávida de significados, agarrada com fazeres de fato entranhados na construção de um mundo onde a regra não seja mutilar a natureza toda em nome do lucro. É um grande desafio.

Digo isso porque no tal Summit Cidades 2025, encerrado ontem (26) em Florianópolis, foi criada uma “Frente Parlamentar do Desenvolvimento Urbano, do Mercado Imobiliário e da Indústria da Construção Civil”. Segundo notícia no site da Câmara de Vereadores de Florianópolis, oito vereadores – todos alinhados com o prefeito Topázio Neto – estão na tal Frente.

O objetivo é “debater políticas públicas para o crescimento sustentável da capital catarinense”. A Frente “pretende agir para evitar que o desenvolvimento urbano resulte em exclusão social e perda de qualidade de vida”. A ideia é “incentivar a elaboração de políticas que tornem a cidade mais justa, inclusiva e inteligente”.

Pois é: “crescimento sustentável”, “exclusão social”, “qualidade de vida”. São palavras/conceitos saindo da boca de quem está diuturnamente a serviço de um projeto de destruição da natureza, concretizado, em 2023, na aprovação de um plano diretor sob medida para os interesses da construção civil e nas dezenas de projetos que, de lá para cá, se alimentam da mesma lógica.

Então, essas palavras/conceitos se bandearam definitivamente para o esgoto da ideologia. Afastemo-nos dessas águas contaminadas por chorume.

Uma revolução, dizia Henri Lefebvre, para realizar todo seu potencial, precisa gerar efeitos na vida cotidiana, na linguagem e no espaço.

Cabe então aos jornalistas elucidar/desalienar a compreensão das disputas e conflitos no espaço geográfico e desacreditar os vendilhões da cidade travestidos de protetores da natureza e das populações empobrecidas.

segunda-feira, 26 de maio de 2025

Senado "passa a boiada" no ano da COP 30 no Brasil


Míriam Santini de Abreu, jornalista

Dei entrevista sábado (24/5) à jornalista Elaine Tavares no programa “Campo de Peixe”, da Rádio Comunitária Campeche, sobre a aprovação, no Senado, do PL 2.159/2021, conhecido como "PL da Devastação", que fragiliza o Licenciamento Ambiental, um dos pilares da Política Nacional do Meio Ambiente. Sem surpresa, os três senadores catarinenses votaram a favor do projeto, que agora volta à Câmara, onde nasceu (em 2004), em função das modificações (péssimas) incorporadas por senadores.

A Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) emitiu nota alertando para as mudanças e cobrando, da Presidência da República, que vete aqueles dispositivos que diretamente afrontam os princípios constitucionais ao deixar de assegurar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Entidades em todo o país já estão se organizando para pressionar o Congresso e o presidente Lula pelo veto. O "PL da Devastação" é tido como um dos maiores retrocessos na legislação ambiental e a aprovação se dá no ano em que o Brasil vai sediar, em novembro, a Conferência do Clima da ONU, a COP Belém.

Santa Catarina vai padecer com as consequências da aprovação do projeto. O estado é um dos mais acometidos por eventos extremos, mas a maioria de vereadores, deputados estaduais e federais e senadores compactua com alterações nefastas na legislação ambiental e urbana.

Destaquei, na entrevista, que Santa Catarina está na vanguarda da destruição da legislação ambiental desde os governos de Luiz Henrique da Silveira, tendo tido atuação decisiva nas mudanças, para pior, no Código Ambiental e Florestal.

A entrevista está neste link: https://radiocampeche.com.br/a-lei-geral-do-licenciamento-ambiental-um-desastre-para-o-brasil/?fbclid=IwY2xjawKgVLZleHRuA2FlbQIxMQABHgl7Jcp9qNkCnC5jQ-ToavwoWUYOsiZD1f8S7MSC3aTz5YnDuY9ig31GyVkC_aem__Kc0hVvL3woK70TFZ_lwRA&sfnsn=wiwspwa

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Verticalização do litoral catarinense e a produção científica


Míriam Santini de Abreu, jornalista

O litoral catarinense vai virando um paliteiro de prédios para especulação imobiliária. A mudança nos planos diretores, como foi o caso de Florianópolis em 2023, favorece os negócios e se dá atropelando a participação popular. Em fevereiro, a imprensa local divulgou que a faixa de 100 km no litoral de SC concentra 4 das 5 cidades com os maiores preços de imóveis do país: Balneário Camboriú, Itapema, Itajaí e Florianópolis, segundo o índice Fipezap. Quem está estudando isto? 

Fiz uma pesquisa rápida e localizei 19 trabalhos. Deve haver mais. Um dos mais recentes é a dissertação de mestrado de Carolina Silva e Lima Schleder, intitulada “Capital e lei no processo recente de verticalização da Praia Central de Balneário Camboriú (SC)” (Universidade de São Paulo, 2024). 

Fui atrás de um livro que reunisse bons artigos sobre o processo de verticalização Florianópolis ao Sul e Florianópolis ao Norte, mas ainda não encontrei. É necessário e urgente reunir as pesquisas existentes e ampliar os estudos, localizar pontos em comum e especificidades, identificar a origem do dinheiro para tanta construção, analisar a (in)capacidade de suporte, o impacto socioambiental, a resistência popular. 

Todo o processo tem a ver com temas como a mudança na legislação ambiental (Códigos Ambiental e Florestal), o sucateamento de órgãos de fiscalização (IPUF e FLORAM em Florianópolis), privatizações e terceirizações. 

Está aí, portanto, um fenômeno que merece uma articulação de diferentes cursos e grupos de pesquisa nas universidades, em especial UFSC, UDESC e FURB. Na imprensa loca, tudo aparece sem conexão e carregado de ideologia, em especial a da “vocação turística”. Falta-nos também jornalismo graúdo para compreender o que está por trás do palavrório imobiliário que ilude a população. Porque, no final das contas, são prédios para especulação. Reina, nas cidades mencionadas, a falta de moradia para os trabalhadores, que penam para pagar alugueis abusivos.

As pesquisas que localizei estão em https://jornalismoambientalsc.blogspot.com/p/trabalhos-sobre-verticalizacao-no.html

sexta-feira, 25 de abril de 2025


Por Míriam Santini de Abreu, jornalista

A divulgação, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da pesquisa “Características Urbanísticas do Entorno dos Domicílios” rendeu, nos meios de comunicação, pautas sobre os dados de arborização. Segundo o Instituto, 58,7 milhões de pessoas (33,7%) moram em vias sem arborização, enquanto 114,9 milhões (66,0%) vivem em vias com presença de árvores, sendo que 55,8 milhões (32,1%) estão em vias com 5 árvores ou mais. 

Na região Sul, duas situações chamaram a atenção: São José (SC) é o município de mais de 100 mil habitantes com menor percentual de moradores em vias com arborização (15,1%), enquanto Maringá, o maior (98,6%). Já Florianópolis está em 24º lugar, entre 27 capitais, no ranking das capitais mais arborizadas. A síntese da pesquisa está no link https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/43166-censo-2022-dois-em-cada-tres-brasileiros-moram-em-vias-sem-rampa-para-cadeirantes

Na mídia catarinense, o fato repercutiu no Portal NSC Total, do grupo que comprou as operações da RBS em Santa Catarina, mas, em 13 parágrafos, a notícia não traz uma só entrevista. Aparece citado apenas o próprio IBGE. O texto, intitulado “Florianópolis está entre as cidades menos arborizadas do país, aponta IBGE”, pode ser visto no link https://www.nsctotal.com.br/noticias/florianopolis-esta-entre-as-cidades-menos-arborizadas-do-pais-aponta-ibge . O Jornal do Almoço, do mesmo grupo, em notícia de 2 minutos e 23 segundos, limitou-se a apresentar os percentuais, também sem entrevistas, conforme o link https://g1.globo.com/sc/santa-catarina/videos-jornal-do-almoco/video/arborizacao-em-areaas-urbanas-13537377.ghtml .

O Diarinho, periódico do município de Itajaí, noticiou o fato sob o título “SC tem segundo pior índice de arborização do país”, em https://diarinho.net/materia/661308/SC-tem-segundo-pior-indice-de-arborizacao-do-pais . O portal destaca que, entre as dez áreas urbanas com as menores taxas de arborização, Santa Catarina aparece com seis municípios, incluindo a capital, Florianópolis. O Diarinho traz, entre aspas, declaração de um analista do IBGE, mas não houve entrevista. É um trecho tirado da notícia publicada na Agência de Notícias do próprio instituto, também usada pelo Portal NSC Total, mas sem indicação de fonte. 

As notícias não fazem qualquer relação com os motivos pelos quais Santa Catarina aparece tão mal no ranking, não cobram do poder público medidas para melhorar o índice de arborização, mostrando as consequências do fato apontado pelo IBGE, ignoram pesquisas científicas em diferentes áreas de conhecimento sobre o assunto (SC tem universidade pública federal e estadual) e não relacionam a realidade do estado com as mudanças climáticas. Dada a atualidade e relevância da pesquisa do IBGE, foi uma oportunidade perdida de fazer boa cobertura jornalística de um tema de interesse de toda a população.

 



Míriam Santini de Abreu, jornalista

Aproveitei o feriadão para ler seis artigos sobre História Ambiental, surgida na década de 70 para tratar do papel e do lugar da natureza na vida humana, definição de Donald Worster no clássico “Para fazer História Ambiental”. Discussão rica para jornalistas interessados na área e que tem, na UFSC, o LABIMHA e, na FURB, o GPHAVI, ambos grupos de pesquisa.

É impressionante o esvaziamento da compreensão da natureza e do espaço no jornalismo catarinense. As empresas não investem em pautas e equipes e grandes jornalistas que entendiam do traçado se aposentaram ou se dedicam a outras áreas nos tortuosos caminhos da nossa profissão.

Não sei que formação sobre SC os estudantes levam do ensino médio para o curso de Jornalismo, e assim seria de grande valia alguma disciplina tratar da relação entre sociedade e natureza, a relação entre elas no jornalismo e o enlace disso tudo com a formação socioespacial catarinense.

Ando à busca de um bom livro sobre História Ambiental com artigos que tenham como estudo especificamente SC. Até agora localizei artigos, mas poucos tendo o litoral como área de interesse. Um livro nesta linha é “Desastres Socioambientais em Santa Catarina”, disponível em https://labimha.ufsc.br/). A produção do GPHAVI está em https://gphavi.blogspot.com/

É interessante o fato de a História Ambiental trabalhar com material jornalístico, e fico pensando no quão pouco irão encontrar, no futuro, nas pesquisas que farão sobre o tempo presente. Dois motivos: 1) pautas, notícias e reportagens estão cada vez mais desidratadas e irrelevantes; 2) não irão localizar conteúdos, dado que as empresas desprezam o cuidado com os acervos virtuais. Vai sendo tudo apagado com o passar do tempo, situação piorada diante do fim dos impressos. Mas cito o caso do ND, que ao menos disponibiliza, no seu portal, os jornais em PDF desde 2012.

Fica a sugestão para o LABIMHA e o GPHAVI oferecerem curso de História Ambiental voltado a jornalistas e organizar um livro com artigos que contemplem, com diferentes objetos de estudo, todas as regiões de SC.

Sobre jornalismo ambiental, reunimos a produção de SC neste blog, em https://jornalismoambientalsc.blogspot.com/p/pesquisas_99.html

sexta-feira, 28 de março de 2025

“Fala Campeche”, jornal a serviço da luta socioambiental em Florianópolis

 





Por Míriam Santini de Abreu - jornalista

O colega jornalista Silvio da Costa Pereira, sabendo do trabalho que temos feito em prol da memória do jornalismo alternativo/independente em Florianópolis, enviou exemplares do jornal impresso “Fala Campeche”. Silvio era um dos jornalistas que produziam o jornal. O “Fala Campeche” foi um marco por visibilizar as lutas do distrito, no Sul da Ilha de Santa Catarina, pela preservação ambiental.

Recebi um exemplar de 15 diferentes edições entre dezembro de 1997 e março de 2007. O jornal surgiu em julho de 1997 e, em março de 2007, a edição número 20 – a última disponível no lote –, comemorava os dez anos de existência e citava a impressão de 8 mil exemplares por edição.

Estão narradas ali as lutas da associação de moradores contra o projeto do IPUF para o Campeche, que desconsiderava a fragilidade ambiental do distrito, os embates na Câmara de Vereadores, a pesca da tainha, a fundação da rádio comunitária, a construção do primeiro prédio de cinco andares no bairro, o fim do Bar do Chico.

Vieram, com os jornais, fotos que mostram o Campeche daquele tempo. Dramática mudança de lá para cá a serviço da especulação imobiliária.

O livro “O campo de Peixes e os Senhores do Asfalto. Memória das lutas do Campeche”, de Janice Tirelli, Raúl Burgos e Tereza Cristina P. Barbosa (organizadores), cita o jornal “Fala Campeche” e recupera a memória do movimento comunitário do distrito, contribuindo com elementos históricos e técnicos sobre as lutas que marcaram as últimas décadas.

Vou deixar os exemplares recebidos aos cuidados da Hemeroteca Digital Catarinense, que com carinho cuida da memória do jornalismo catarinense, na atualidade definhando em silêncio.

COP 30 Brasil/Belém chegando sem debate nos cursos de jornalismo e na imprensa catarinense

  Míriam Santini de Abreu, jornalista A poucos meses da COP 30 Brasil/Belém, há algum curso de jornalismo em Santa Catarina discutindo a rel...