sexta-feira, 5 de abril de 2024

Livro e blog sistematizam pesquisas e práticas de Jornalismo Ambiental em Santa Catarina


Por Míriam Santini de Abreu*

O conhecimento sobre o jornalismo ambiental em Santa Catarina é o objeto que a equipe da Revista Pobres & Nojentas, que desde 2006 atua em Florianópolis, vem buscando consolidar. A primeira iniciativa foi o lançamento, em dezembro de 2023, do livro “Território e texto: jornalismo ambiental em Santa Catarina”, com seis artigos de jornalistas que, em momentos de sua trajetória, escreveram sobre a relação entre sociedade e natureza no estado (https://tinyurl.com/9puwaaz).  A segunda foi a criação deste blog, em fevereiro passado, para reunir pesquisas na área e também sobre a história do movimento ambientalista estadual.

O primeiro levantamento do material localizado sobre jornalismo realizado pela revista revelou a existência de cinco Trabalhos de Conclusão de Curso (TCCs), seis dissertações, oito artigos e dois livros. A mais antiga pesquisa localizada foi a minha dissertação de mestrado em Geografia, de 2004, analisando o discurso jornalístico sobre o desenvolvimento sustentável. O mais recente, de 2024, é a dissertação de mestrado de Camila Collato intitulada “Jornalismo ambiental em Santa Catarina: direitos humanos e da natureza sob a perspectiva dos grupos RBS e NC”, defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em Jornalismo da UFSC.

As primeiras constatações provisórias com o levantamento foram as seguintes: 1) a revisão bibliográfica das pesquisas traz o conhecimento do jornalismo em geral e do jornalismo ambiental em particular, mas as pesquisas, independentemente da orientação teórico-metodológica e dos objetos empíricos, em geral não dialogam com trabalhos anteriores, ainda que poucos, produzidos no estado; 2) em minha dissertação, que completa 20 anos em 2024, afirmo que o espaço é constitutivo do discurso jornalístico sobre meio ambiente, mas verifica-se que as marcas da formação socioespacial catarinense praticamente não são levadas em conta nas análises.

A situação é incompatível com a realidade socioespacial tão diversa de Santa Catarina e a necessidade de um jornalismo que a interprete. O geógrafo Armen Mamigonian (2003) afirma que, no decorrer do processo histórico, delinearam-se em Santa Catarina três regiões industriais importantes identificadas como a região alemã, o Oeste agroindustrial e a região carbonífero-cerâmica do Sul. Cada uma dessas regiões lida com impactos ambientais comuns, como o desmatamento e a poluição do solo e da água, mas singulares na forma como se expressam no cotidiano da população. Porém, o jornalismo catarinense não tem abordado tão complexa realidade e parte expressiva das pesquisas localizadas também não leva em conta essas particularidades socioespaciais. 

A recente pesquisa de Camila Collato é importante por dialogar com trabalhos anteriores e revelar a situação da cobertura na atualidade, concluindo o seguinte: a) a cobertura privilegia uma constituição antropocêntrica de sentidos, apoiando-se em uma base científica moderna em relação ao meio ambiente, sendo este abordado majoritariamente por meio do dualismo humano x Natureza; b) é fragmentária, ao apresentar uma baixa interlocução entre áreas de conhecimento e saberes e; c) por vezes, é fatalista, ao furtar-se do papel de fomentador de um debate público crítico sobre responsabilidades e possíveis soluções diante dos problemas ambientais enfrentados pela população. A autora destaca anda a baixa participação dos cidadãos, com a predominância de fontes documentais e oficiais, e um jornalismo orientado para a construção de sentidos de apelo modernizante por meio de discursos econômicos de matriz capitalista.

Nas pesquisas para o livro lançado em 2023, a equipe da revista encontrou um artigo publicado em 25 de setembro de 2021 no Portal NSC Total com o seguinte título: “Lauro Bacca: Santa foi o primeiro jornal de Blumenau a abrir espaço à conscientização ambiental”. Bacca é ambientalista e presidente da Associação Catarinense de Preservação da Natureza (Acaprena), a primeira entidade ambientalista do estado. No artigo, Bacca conta que, em 1978 e 1979, apareceu o resultado da primeira parceria semiformal entre a Acaprena e o Santa. O Jornal de Santa Catarina, conhecido como O Santa, é sediado no município de Blumenau e pertence à NSC Comunicação, grupo para quem a empresa gaúcha RBS vendeu seus veículos no estado. O grupo NSC liquidou com as edições impressas semanais de seus jornais, restando apenas revista de final de semana.

Nos anos citados, 1978 e 1979, havia duas páginas inteiras dedicadas ao meio ambiente no Santa, publicadas nas edições de fim de semana com edição do jornalista Moacir Loth com o então diretor da Acaprena no cargo da presidência, Nélcio Lindner. Provavelmente trata-se de uma das primeiras iniciativas no país de uma editoria dedicada exclusivamente ao meio ambiente.

Atualmente, no estado, o site do jornal O Blumenauense tem uma aba específica denominada Meio Ambiente dentro do link Geral. A primeira notícia é datada de 11 de outubro de 2013. São, portanto, 10 anos de cobertura. O link é https://oblumenauense.com.br/tag/meio-ambiente/. A Folha Metropolitana, de Joinville, também exibe, no menu do site, o link Meio Ambiente, em https://www.folhametropolitana.com/meio-ambiente/. São iniciativas que merecem pesquisas específicas sobre conteúdos e discursos.

A conclusão desses esforços para consolidar o conhecimento sobre o jornalismo ambiental em Santa Catarina é que os dois grupos hegemônicos mais importantes de mídia no estado, NSC e ND, desconsideram a importância de interpretar jornalisticamente a grave realidade socioambiental regional, situação que vem se agravando com o enxugamento de profissionais nas redações, restando a pequenos sites de base local a iniciativa de manter editorias sobre o tema, ainda que não haja pesquisas direcionadas à analise do material divulgado.

Referência:

MAMIGONIAN, Armen. Projeto integrado de pesquisa: Santa Catarina – sociedade e natureza. Relatório final de pesquisa. Florianópolis, 2003. 

* Jornalista, doutora em Jornalismo, mestre em Geografia e especialista em Educação e Meio Ambiente

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Arborização e crise climática em pauta

Uma pauta pulando para o jornalismo ambiental em Santa Catarina: a reportagem intitulada “Em Belo Horizonte, arborização dos bairros repete ...